A constituição cidadã não está próxima do cidadão
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segunda, 05 de setembro de 2022

No final do mês de agosto, o Jornal Nacional iniciou uma série de reportagens reflexivas chamada “Brasil em Constituição”, mostrando como a “lei maior” está presente em nosso dia a dia, garantindo direitos e liberdades.
    A primeira reportagem da série começou colocando uma cópia do livro impresso da Constituição em cima de uma cadeira, em vários pontos do Brasil. Pessoas de diferentes perfis econômicos e etários foram convidadas a abrir e ler esta cópia da nossa Carta Magna.
    Assistindo ao programa, me senti como se estivesse na condução de um grupo focal, que é um tipo de pesquisa qualitativa em que se investiga aprofundadamente o conhecimento e a percepção das pessoas sobre diferentes temas do cotidiano.
    Para mim, é como se a reportagem estivesse congelando em um vídeo o que eu e as equipes do IPO – Instituto Pesquisas de Opinião aprendemos todos os dias: que as pessoas não conhecem a Constituição e, portanto, não conhecem os seus direitos e deveres.
     A matéria começa com questionamentos impactantes, com uma pessoa que abre o livro e pergunta: “Constituição, é construir alguma coisa?” E vai mostrando que a maioria das pessoas nunca tiveram acesso a uma versão física do livro e, muito menos, ao seu conteúdo. Algumas declarações mostram a intensidade desse distanciamento: “É a primeira vez que eu pego uma Constituição”. “Emocionante, eu jamais ouvi falar nestas palavras.”
A emoção e a esperança transparecem nos depoimentos. É como se as pessoas encontrassem nas palavras da Constituição o acolhimento de suas expectativas, um alento para as suas dores, um olhar sobre o futuro: “Rapaz, tomara que cumpram tudo isso aqui, para futuramente meu neto acompanhar tudo o que tem nessa Constituição.”
Conforme os entrevistados vão lendo os parágrafos da nossa Carta, que é alma de nossa democracia, se surpreendem com os direitos estabelecidos: “Se esse livro fosse mais divulgado, se as pessoas parassem mais para ler, para ver, eu acho que talvez iria mudar mais o quadro.” 
Como em “um passe de mágica”, é como se todas aquelas promessas de políticos aparecessem em uma “bíblia da sociedade”, onde os direitos sociais como a educação, a saúde, a alimentação, direitos culturais, a segurança, o desenvolvimento e a justiça parassem de ser vistos como “favores do Estado” e ganhassem o status de uma carta de compromisso. Uma visão como esta, reposiciona a percepção da sociedade sobre o político, sobre o gestor e o funcionário público, que passam a ser percebidos como guardiões e “servidores” desta “carta sagrada”. 
Em um momento marcante da entrevista, um senhor exclama sobre o papel norteador da Constituição, com ela: “As pessoas iriam saber seus direitos, iam saber votar e cobrar. Eu não sabia que eu tinha direitos como à educação, eu nunca tinha visto um livro deste”.
A Constituição é nossa bússola, a referência de nossos direitos. A Constituição ganha vida quando um povo se apropria dela e motiva ou condiciona os políticos a trabalharem de acordo com a mesma. Ao contrário, quanto menor for o conhecimento sobre a Constituição, maior será a adesão a políticos populistas, clientelistas que atuam como despachantes da Constituição, dando a ideia de que quando fazem uma política pública, estão fazendo um favor para a população. 
A Constituição precisa estar presente em todos os momentos, ambientes e instituições da vida social, inclusive como arquivo digital do nosso celular.


 

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