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Violência contra a mulher
Lei Maria da Penha completa 16 anos
Inúmeras mudanças foram realizadas ao longo do tempo, a fim de combater agressões e abusos
Por: Letícia Severiano
Publicado em: sexta, 12 de agosto de 2022 às 15:08h
Atualizado em: sexta, 12 de agosto de 2022 às 17:21h

Na série “Bom Dia, Verônica”, da Netflix, a narrativa em torno da violência física e psicológica contra a mulher chega a chocar e até desestabilizar o telespectador em diversos momentos. Apesar de parecer surreal e inverossimilhante em alguns aspectos, a série traz à tona o cotidiano de milhares de mulheres no país, pois diariamente situações como aquelas são vividas e não denunciadas por quem sofre as agressões, assim como é retratado na ficção. 
Na vida real e fora das plataformas de streamings, no último domingo, 7, a Lei nº 11.340/06, conhecida como Lei Maria da Penha, completou 16 anos de ações e enfrentamentos a violência doméstica e familiar contra a mulher. Além disso, para celebrar e dar visibilidade à causa, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos lança a campanha Agosto Lilás, a fim de promover ações de conscientização para o fim da violência contra a mulher, além de divulgar o canal de denúncias da Central de Atendimento à Mulher, pelo Ligue 180.

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Mudanças 
Ao longo dos 16 anos, a Lei Maria da Penha vem passando por alterações e mudanças que fortalecem o aparato legal. No ano de 2019, por exemplo, foram seis novas normas legislativas, entre elas, a Lei nº 13.827/19, que permitiu a aplicação de medida protetiva de urgência a? mulher em situação de violência doméstica e familiar ou a seus dependentes. O dispositivo também determinou que o registro da medida protetiva de urgência seja feito em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a obrigatoriedade da informação quando a vítima portar algum tipo de deficiência. Também foi instituído e determinada a responsabilidade do agressor pelo ressarcimento dos serviços prestados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no atendimento às vítimas de violência doméstica e familiar e aos dispositivos de segurança por elas utilizados. Já as Leis nº 13.882/19 e 13.880/19 abrangeram, respectivamente, a garantia de matrícula dos dependentes da mulher vítima de violência doméstica e familiar em instituição de educação básica mais próxima de seu domicílio; e a apreensão de arma de fogo sob posse de agressor em casos de violência doméstica.
Ainda em 2019, entre as disposições, a Lei nº 13.894/19 previu a competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher para a ação de divórcio, separação, anulação de casamento ou dissolução de união estável. A norma também estabeleceu a prioridade de tramitação dos procedimentos judiciais em que figure como parte vítima de violência doméstica e familiar.
Em 2020, foi estabelecida a obrigatoriedade referente ao agressor, que deve frequentar centros de educação e reabilitação e fazer acompanhamento psicossocial.
Em 2021, foi definido o programa de cooperação Sinal Vermelho contra a Violência Doméstica como uma das medidas de enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher; modificada a modalidade da pena da lesão corporal simples cometida contra a mulher por razões da condição do sexo feminino; e criou o tipo penal de violência psicológica contra a mulher.

Outras medidas
Além das mudanças dos anos anteriores, em 2021, foram publicadas três normas diretamente relacionadas à Lei Maria da Penha. Entre elas, inclusão do artigo no Código Penal (CP) para tipificar os crimes de perseguição (stalking), e a Lei nº 14.149/21, que institui o Formulário Nacional de Avaliação de Risco, com o intuito de prevenir feminicídios.
O formulário, composto por 27 questões, ao ver da secretária nacional de Políticas para as Mulheres, Ana Muñoz Reis, é uma ferramenta necessária para prevenir feminicídios e orientar a atuação dos órgãos de segurança pública. As questões mapeiam a situação da mulher em situação de violência, do agressor e o histórico de violência na relação entre os dois. 

Dados preocupantes 
Mesmo com medidas que favorecem e auxiliam na proteção e cuidado com as vítimas, neste mês de conscientização contra todos os tipos de violência sofrida por mulheres, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos disponibiliza informações sobre denúncias e ocorrências no Brasil. No primeiro semestre de 2022, a central de atendimento registrou 31.398 denúncias e 169.676 violações envolvendo a violência doméstica contra as mulheres. Os dados são referentes à violência doméstica ou familiar contra mulheres brasileiras até a primeira semana de julho deste ano.
No Rio Grande do Sul, os números ainda são igualmente preocupantes. De acordo com as informações da Secretaria da Segurança Pública (SSP), por meio do Observatório da Violência Contra a Mulher, em 2021 foram monitorados 53.353 casos envolvendo violência contra a mulher. De janeiro a julho deste ano, foram registrados 25.174 casos no RS. Dentre esses números, são contabilizadas agressões como ameaças, lesão corporal, estupro, feminicídio consumado e o feminicídio tentado. 

Tipos de violência
Embora muitos pensem que as agressões são apenas físicas, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos ressaltou e esclareceu os tipos de violência contra a mulher, sendo a violência física configurada em qualquer ação que ofenda a integridade ou a saúde do corpo, como bater ou espancar; empurrar, atirar objetos na direção da mulher; sacudir, chutar, apertar; queimar, cortar e ferir. Já as violações sexuais consistem em qualquer ação que force a mulher a fazer, manter ou presenciar ato sexual sem que ela queira, por meio de força, ameaça ou constrangimento físico ou moral. Entre os exemplos estão obrigar a fazer sexo com outras pessoas; forçar a ver imagens pornográficas; induzir ou obrigar o aborto, o matrimônio ou a prostituição. 
A violência psicológica, de acordo com a Lei nº 13.772/18, é “qualquer conduta que cause dano emocional e diminuição da autoestima, prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir, ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”.
Entre as violações psicológicas também incluem xingar; humilhar; ameaçar e amedrontar; tirar liberdade de escolha ou ação; controlar; vigiar e inspecionar celular e computador da mulher ou seus e-mails e redes sociais; isolar de amigos e de familiares; impedir que trabalhe, estude ou saia de casa; fazer com que acredite que está louca.
Já no âmbito patrimonial, a violência consiste em qualquer ação que envolva retirar o dinheiro conquistado pela mulher com seu próprio trabalho, assim como destruir qualquer patrimônio, bem pessoal ou instrumento profissional. Entre as ações, estão incluídos destruir material profissional para impedir que a mulher trabalhe; controlar o dinheiro gasto, obrigando-a a fazer prestação de contas, mesmo quando ela trabalhe fora; queimar, rasgar fotos ou documentos pessoais.
A violência moral é qualquer ação que desonre a mulher diante da sociedade com mentiras ou ofensas, entre os exemplos incluem xingar diante dos amigos; acusar de algo que não fez; falar coisas que não são verdadeiras sobre ela para os outros.

Denúncias 
Em muitos casos, a denúncia não é registrada seja por medo, dependência financeira, receio de afetar a vida dos filhos ou mesmo os julgamentos da família e da sociedade. Na região, a delegada e comandante da 14ª Delegacia Regional de Polícia de Palmeira das Missões, Aline Dequi Palma, explica a importância da denúncia de qualquer tipo de violência que a mulher esteja sofrendo. “A Polícia Civil sempre procura dar uma atenção especial a esse tipo de crime, porque sabemos que a violência inicia em um estágio e tende a aumentar cada vez mais. Geralmente começa com uma simples ameaça e pode evoluir até o feminicídio, caso a mulher não faça a denúncia, não registre a ocorrência contra aquele agressor e permaneça vivendo no mesmo ambiente que ele”, ressalta. 
Aline também explica o trabalho que é desenvolvido junto à vítima de violência no momento da denúncia. “Aqui na região, inclusive, nós temos duas Salas das Margaridas já criadas, que são ambientes acolhedores para que a vítima se sinta melhor no momento que chega na delegacia para fazer o registro. Então, nós temos procurado trabalhar nos policiais também essa questão do atendimento às vítimas, para que a gente consiga estimular cada vez mais as mulheres a fazerem o registro, a manter a representação, ou seja, não desistir da representação e nem de dar seguimento àquela denúncia, para que o agressor possa ser efetivamente responsabilizado pelos seus atos”, destaca a delegada. 
Além da denúncia presencial, o registro pode ser feito também pela internet. Por meio da plataforma digital delegaciaonline.rs.gov.br, criado pela Polícia Civil do Estado, as vítimas podem relatar as agressões sofridas. A denúncia pela internet facilita a solicitação de medidas protetivas de urgência.


Rede de apoio 
Em 2020, a Brigada Militar (BM) de Frederico Westphalen criou a Patrulha Maria da Penha, que realiza atendimento específico para as vítimas de violência que tenham medida protetiva de urgência em vigência. De acordo com a sargento Aline Carvalho da Silva Milani, desde 2020 foram registrados 583 atendimentos apenas no município, sendo a média mensal de 21 atendimentos oferecidos à população feminina. Ao todo, em 2021, foram registradas 87 ocorrências de violência contra as mulheres; já em 2022, até o momento, 78 registros foram feitos. 
Além da Patrulha, o Centro de Referência de Assistência Social (Cras) e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) oferecem atendimento psicológico às mulheres que sofrem de violência doméstica, além de oferecer acolhimento às vítimas. 

Fonte: Jornal O Alto Uruguai
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