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Fim dos rodeios no RS
Projeto protocolado por deputado gera polêmica entre tradicionalistas
Caso aprovado, texto-base prevê multa aos organizadores que descumprirem a lei, além da suspensão de dois anos na realização de atividades no Estado
Por: Natalie Soares
Publicado em: quarta, 18 de maio de 2022 às 13:41h
Atualizado em: quarta, 18 de maio de 2022 às 14:47h

O rodeio crioulo surgiu no Rio Grande do Sul na década de 1950, a partir dos torneios de tiro de laço competitivos, utilizando cavalos da raça crioula, com o objetivo de resgatar manifestações das tradições do campo. O primeiro foi realizado em Vacaria, e a partir de então se proliferou e motivou mais pessoas a vivenciarem os costumes gaúchos. Com o passar dos anos, as provas de laço foram ganhando cada vez mais adeptos, inclusive mulheres, porém, agora no início do mês de maio, laçadores de todo o Estado foram surpreendidos com uma notícia que os deixou intrigados, e que colocou toda a história e um costume de décadas em xeque.
No dia 4 de maio, o deputado estadual Rodrigo Maroni (PSDB) protocolou um projeto de lei que propõe o fim dos rodeios no Estado do RS. Como um ativista da causa animal, Maroni destaca que o projeto visa acabar com maus-tratos em eventos, onde, para ele, os animais são humilhados e machucados. “Os rodeios são uma prática cruel. As provas colocam touros, cavalos e outros bichos em situações de estresse físico e psicológico. Eles recebem até mesmo choques elétricos antes de entrar na arena para ficar com medo e entrar gritando. A única justificativa disso (dos rodeios) é ganhar dinheiro em cima da brutalidade”, afirma o deputado.
Ainda de acordo com Maroni, a pior prova é a de laço. “É engano imaginar que o rodeio representa a cultura do campo. Ele não faz parte da nossa tradição. Foi importado dos Estados Unidos e não traz nenhum enriquecimento ou aprendizado cultural. Além disso, os eventos poderiam continuar, mas com shows e outras atrações”, sugere o parlamentar.
Uma das argumentações de Maroni na defesa do projeto é que em 2011, no rodeio de Barretos, um bezerro foi morto. “Isso prova que os maus-tratos acontecem. Não se trata de acidente, mas sim de algo que poderia ser evitado. Há tantas opções de entretenimento, então, para que continuar com algo que é tão cruel?”, argumenta o deputado.
Como forma de protesto e em defesa dos rodeios, entidades tradicionalistas já se manifestam contra o projeto, que, segundo eles, não será aprovado. Na terça-feira, 10, deputados contrários à opinião de Maroni compareceram pilchados em sessão da Assembleia Legislativa do RS.
Caso o deputado tenha aprovado o projeto, o texto-base prevê multa aos organizadores que descumprirem a lei, além da suspensão de dois anos na realização de atividades no Estado. No momento, o projeto aguarda votação da Assembleia que ainda não tem previsão.

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“Isso só demonstra o desconhecimento da cultura”
Na área de abrangência do jornal O Alto Uruguai, assim como em todo o Estado, a realização de rodeios crioulos é algo comum entre os tradicionalistas, e anualmente reúne um grande número de laçadores, de todas as idades. De acordo com o advogado e vice-coordenador da 28ª Região Tradicionalista (RT), Silvio Cesar Rossatto, o Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG) promoveu incontáveis eventos nesses 56 anos de existência. 
– Aqui na nossa região os rodeios crioulos sempre foram muito bem aceitos. Os rodeios, torneios e festas campeiras, todos são baseados na origem da cultura do tiro de laço e nos costumes do homem do campo, prezando sempre pelo bem-estar e pelo respeito aos animais. Em todos os eventos realizados pelos nossos CTGs e piquetes, são tomadas todas as medidas necessárias para proporcionar o bem-estar animal. Como tradicionalista, participante e organizador de rodeios, repudio o projeto do deputado Maroni. Tais práticas nunca foram admitidas nos eventos promovidos pelo MTG e por suas entidades filiadas, consistindo a justificativa do parlamentar em um argumento falacioso que só demonstra o desconhecimento da cultura, dos valores e dos ideais do homem do campo, cultivados e preservados pelo MTG na promoção dos eventos campeiros – destaca Rossatto. 
Outro defensor dos rodeios crioulos, o médico-veterinário Edson Buzzeto afirma que nunca atendeu animais machucados por motivo de práticas de provas de laço nesse tipo de evento. “Atualmente, toda a atividade de rodeios, exposições, remates, cavalgadas, provas funcionais, é obrigatória a presença de médico-veterinário atuando como responsável técnico, por determinação do Ministério da Agricultura, onde ele é obrigado a zelar pelo bem-estar animal e as condições em que se realiza o evento do início ao fim, e onde houver situação em contrário é preciso fazer um relatório das ocorrências, denunciando os fatos de maus-tratos se houver, para que todas as medidas cabíveis sejam tomadas”, explica o profissional.
Ainda, segundo Buzzeto, ele costuma participar de diversos rodeios e nunca presenciou trauma nos animais. “Nunca foi preciso o emprego de medicamentos nos animais. Quando ocorre algum tipo de trauma ou o animal apresenta qualquer sinal de dificuldade é retirado da prova. Então, como profissional que cuida da saúde dos animais, posso afirmar que a prática dessa atividade campeira no nosso Estado não condiz com o que o deputado está argumentando”, frisa Buzzeto.

O que diz o MTG
O Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), em seu site oficial, emitiu uma nota de repúdio ao projeto de lei apresentado pelo deputado Maroni, dizendo que o político apresenta “o desconhecimento da cultura, dos valores e dos ideais do homem do campo” e que “tais práticas nunca foram admitidas nos eventos promovidos pelo MTG e por suas entidades filiadas". 

Patrimônio histórico e cultural do Estado
Após a polêmica no parlamento, o deputado estadual Mateus Wesp (PSDB) protocolou, na Assembleia Legislativa, um projeto de lei que declara os rodeios crioulos como patrimônio histórico e cultural imaterial do Rio Grande do Sul. Ele afirma que respeita todas as opiniões, mas que discorda fortemente da ideia de Maroni. “Entendo que os rodeios crioulos fazem parte da tradição campeira gaúcha e necessitam, cada vez mais, serem preservados, cultivados, fortalecidos e valorizados em nosso Estado”.


 

Fonte: Jornal O Alto Uruguai
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